Caminhei muito.
Encontrei pessoas "sim" e pessoas "não".
Gente sorriso e gente sisuda. Poucas meio termo. Todas chamaram a minha atenção e registraram sua passagem conforme suas características. Aprendi o bastante, mas não o suficiente, com cada uma delas. Fui avaliando os detalhes e catalogando as diferentes nuanças, num exercício de vida, que não pude evitar.
De uns tempos para cá, tenho refletido sobre um aspecto que me escapou nos pormenores... É o que se refere ao amor.
Existem pessoas que amam e outras que se deixam amar. Parece trocadilho ou, então, inversão de ideias. Asseguro que não se trata de antítese ou metáfora. É a realidade constante, e pouco percebida, das relações afetivas do ser humano.
Comecei a montar o quebra-cabeça quando revi pedaços da minha própria trajetória de relacionamentos. Fiquei pasma da quantidade de peças que se encaixaram nessa constatação, de que uns amam e outros se deixam amar. Nossa!
Os que amam se destacam dos que se deixam amar por várias particularidades. Tentar enumerá-las é enveredar por um misterioso universo e, como não tenho o mapa da mina, fica complicado demais. Mas sempre é oportuno assinalar alguns pormenores para esclarecer aos que, também, chegaram a essa conclusão.
Quem ama acende a luz e mostra o rosto; quem se deixa amar fica na penumbra e disfarça a fisionomia. Quem ama abre os braços e abre a guarda; quem se deixa amar esquiva-se e esconde-se detrás de armaduras. Quem ama não foge à luta e encara o perigo; quem se deixa amar nunca entra em briga e nem emite opiniões.
Quem ama fala, canta, assovia, gesticula; quem se deixa amar faz silêncio entre um murmúrio e outro e se move como sombra.
Quem ama sabe; quem se deixa amar desconhece. Quem ama adivinha; quem se deixa amar omite. Quem ama faz "das tripas, coração" e desempenha o papel com o melhor de si; quem se deixa amar assiste da coxia e, raras vezes, aplaude.
Entre amar e se deixar amar está a incompreensão das relações amorosas. Um oferece e o outro recebe. O equilíbrio, o prumo, o fiel da balança é raramente encontrado. Relação de troca? Pode ser!
Mas é uma troca desleal e injusta. O que se vê por aí é desencontro e mal-entendido. De um lado aquele que ama e do outro o que se deixa amar e no meio um vazio de fazer medo. Solidão a dois, sem dúvida.
E sempre aquele que ama paga o ônus da festa. O que se deixou amar sai ileso e deita a cabeça no travesseiro para mais uma noite de descanso. Afinal, amanhã encontrará alguém que o ame e, então, se deixará amar do alto da sua indiferença e pretensa imunidade. Aquele que amou, continuará amando, independente do troco!
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